quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Nelson Batista: Perdemos Prestigio

Hoje assistimos nos Bombeiros a uma situação de instabilidade, resultante da perda do prestígio que era reconhecido ao bombeiro.


Lembramo-nos que esta nobre actividade surgiu no passado daqueles que voluntariamente acudiam aos incêndios, e que normalmente eram carpinteiros ou gentes da terra, oriundas de outras profissões, essas que hoje são em muitos casos consideradas de pouco dignas ou sem valor.


As necessidades impostas pelas populações obrigaram no passado a que estes primeiros voluntários se transformassem naquilo que é e continua a ser, a actividade ou profissão mais reconhecida pelos cidadãos, facto esse, que resulta do sentimento de segurança que ainda conseguimos transmitir.
No entanto, é no nosso próprio seio que hoje se desenvolve um sentimento de frustração, alimentado por uma sociedade cada vez mais injusta, mas principalmente pela incapacidade daqueles que os deveriam representar e defender, terem estagnado no tempo e de se terem direccionado para outros interesses, esquecendo-se daqueles homens e mulheres que integram os corpos de bombeiros, e que quer queiramos quer não, continuam a ser a razão da sua existência.


Diversas vezes, aqui ou ali, manifestações ou ameaças de que um dia estes nobres homens e mulheres viram costas a aquilo que mais que uma profissão, é uma opção de vida e um exemplo de cidadania, atitudes e pensamentos que apesar de serem mais emotivos do que verdadeiramente reais, tem vindo a aumentar resultante do descrédito que tem vindo a ser lançado sobre estes.
É necessário pensar, no que leva a alguém optar por servir o próximo, arriscando a sua vida em muitos casos para proteger aquele que não quer ser protegido, ou para salvar aquele bem que afinal de valor somente o sentimental, e depois se vê insultado na sua pessoa e agredido no seu intimo, sem que alguém se atravesse na sua defesa ou pelo menos dar-lhe a oportunidade de se defender, mas não obstante, mantêm-se disponível para mais uma missão, levando no seu pensar actos e atitudes que somente serviram para o descredibilizar.


Esta atitude de continuidade, não resulta de uma atitude senil ou de alguma doença mental, mas sim da gratificação que é a satisfação daquela vida que salvaram, do incêndio que extinguiram, do sentimento de missão cumprida, que supera todos os pontos negativos que nesse momento ficaram a pertencer ao passado. É este conjunto de sentimentos que permite a que homens e mulheres se diferenciem de outros profissionais, uma vez que o bombeiro não vê a sua actividade como uma tarefa, uma obrigação, mas sim, um dever que o leva ao extremo da dedicação que é colocar em risco a sua vida.


No entanto, estes homens e mulheres não são constituídos por ferro, ou outro metal frio e insensível, e vão acumulando ao longo da sua vida todas as atitudes negativas, as injustiças e a falta de reconhecimento daqueles que os representam, dando origem a que mais tarde ou mais cedo se deixem dominar pela frustração e pelo sentimento de descrédito daquilo que afinal está no sentimento nobre que é o ser bombeiro, e que apesar da mágoa, da dureza da decisão, acaba no abandono de uma actividade que afinal desempenhavam de uma forma altruísta e abnegada, tudo, porque apesar de sempre terem actuado em equipa, sempre carregaram o fardo solitário de nunca terem sido ouvidos ou defendidos.


Urge atender a necessidade de ouvir, de dar atenção, às vozes que se levantam, à insatisfação e indignação, cada vez mais presente, ao abandono cada vez mais visível, uma vez que se corre o risco de deitar por terra tudo aquilo que se construiu, o prestígio que se ganhou, e a disponibilidade daqueles que ainda acreditam que é possível mudar e corrigir os erros, não do passado, mas do presente, para que o futuro nos garanta que numa sociedade cada vez mais mercantilista e economicista ainda existam cidadãos anónimos que se disponibilizem ao cumprimento desta tão nobre missão que é a de ser Bombeiro.

Um bem-haja a todos,

Autor: Nelson Batista
Fonte: Bombeiros.pt